O homem de lata.

Restava um corpo cansado, suas olheiras quase negras, as luzes queimavam e caia na escuridão, a escuridão dos olhos abertos, ele não os fechava, ele não dormia, nem descansava.
Ele tinha serviços incompletos, não sossegava, queria construir pontes, ligar cidades, construir edifícios cada vez mais perto do céu.
Ele já tinha calos nos dedos, esqueceu que podia sentir forme, esqueceu dos vizinhos, dos amigos, da família e da namorada, não era o bastante, ele não estava satisfeito.
Já deixou claro que quando terminar seus dias não quer ser enterrado tão pouco se tornar cinzas.
No final ele quer ser enlatado, para que ele não precisasse saciar seus vícios ruins, não ter que saciar a fome, a sede, o cansaço sempre.
Essas sim são as drogas, suas necessidades impróprias, tiram-lhe a lucidez essencial para botar de pé mais um arranha-céu, assim segue sua vida com os papeis trocados, os vícios no lugar das necessidades até seu calo curar, até seus olhos não agüentarem e de uma vez por todas, fechá-los para não abrir e finalmente se tornar um homem de lata.
Aos poucos passou a usar fios no lugar de neurônios.
Já não sentia sabor, já não sentia prazer, já não sentia amor, tinha muito que fazer.
Aos poucos tornou artificial sua inteligência.
Na sua frente só enxergava seu relógio, suas réguas, suas anotações e suas novas criações.
Aos poucos trocou sangue por óleo, tornou fria sua carne, tornou rígida sua pele, antes macia.
De tanto trabalhar, já não sabia nada, se lá fora chovia ou fazia sol, se era inverno ou verão, só sabia da sua selva de pedras e de metal, onde os animais vivem perdidos e apressados.
Seu sonho é ser um robô, dispensar distrações, não sentir sede ou fome, se livrar dos amigos e da família, meras distrações, não sentir saudades.
Aos poucos trocou o coração por uma maquina que bombeava de acordo com sua potencia elétrica.
Enfim, um sonho que virou realidade, o homem que ficou encinzentado, frio e vazio, finalmente se tornara: um homem de lata.

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